sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

RESSUSCITA OS SONHOS DE QUEM ???


A música “RESSUSCITA-ME” gravada por Aline Barros tem gerado muita polêmica no meio evangélico por causa de sua mensagem. Muitas pessoas afirmam que, do início ao fim, é uma letra com conteúdo extra-bíblico (embora trate do episódio da ressurreição de Lázaro, narrado no Evangelho de João). No fundo, acho um pouco de exagero nas críticas, pois a maioria dos "erros" se dá por causa de uma liberdade poética mal compreendida. Mas não restam dúvidas que a letra apresenta equívocos que, à luz da Bíblia, se mostram nocivos à Igreja e à sã doutrina. Não critico quem a canta, mas a letra da canção, admoestando os compositores a tomarem mais cuidado.

Embora tenha uma melodia agradável, associada à bela voz de Aline e a um bom arranjo musical, a música a meu ver se utiliza exageradamente de liberdade poética (que deveria ser evitada ou reduzida ao máximo, dada a necessidade de as composições evangélicas serem submissas à verdade teológica). A letra peca, sobretudo, em um aspecto: o antopocentrismo, a valorização do sonho humano, principalmente quando fala nas entrelinhas que “inimigos” (a eterna síndrome de perseguição dos crentes neopentecostais brasileiros, que beira à esquizofrenia!) estão tentando sepultar a alegria do crente, querendo ver os seus sonhos cancelados. Finalmente, o protagonista pede a Deus em súplica “ressuscita os meus sonhos”.

Sonhar não custa nada ― já diz o velho ditado, já dizia o samba-enredo de uma grande escola de samba do Rio de Janeiro que sonhava com o tricampeonato na Sapucaí... e não conseguiu! Os sonhos, os projetos, os planejamentos fazem parte da natureza do homem. Há quem diga que um homem sem sonhos é menos que um homem. Não há nenhum pecado em sonhar, em planejar, em executar tais planejamentos no objetivo de se alcançar algo lícito. Entretanto, desde o Antigo Testamento o Senhor já deixa claro que “o coração do homem pode fazer planos, mas a resposta certa vem da boca do Senhor” (Pv 16:1). No Novo Testamento, Jesus já deixa claro na oração do Pai-Nosso que os nossos planos devem estar sempre submissos à vontade de Deus e o Reino tem prioridade sobre o indivíduo: “Venha o teu reino, seja feita a tua vontade, assim na terra como no céu” (Mt 6:10). Ele próprio submeteu-se a esta vontade (Mt 23:36-46), abrindo mão da sua própria.

O fato pode não ser muito agradável, mas tem que ser dito: Deus não tem qualquer compromisso em realizar ou satisfazer os sonhos do homem, de forma individual! Seu compromisso é com a implantação de Seu Reino, e se preciso for, que o homem se submeta aos sonhos do Senhor, e jamais Ele, o Senhor, se submeta aos sonhos humanos. Na verdade, vemos nas Escrituras um Deus Todo-Poderoso especialista em destruir sonhos pessoais, em prol de um plano muito maior que os sonhos mesquinhos dos homens. Basta olhar o texto sagrado, para que esta verdade salte aos olhos.

Vejamos a vida de Abrão, ainda em Ur dos Caldeus, rico, bem estabelecido em sua terra e ao lado de seus parentes e amigos. De repente, o Deus Eterno o chama para deixar família, terra, comodidade, em suma, abandonar todos os seus sonhos para satisfazer o sonho divino de criar para Si uma nação escolhida... Saiu às cegas, sem nem mesmo saber para onde ia, em obediência ao Deus destruidor de sonhos...

José, o sonhador-mor, teve todos os seus sonhos de adolescente destruídos por seus irmãos quando estes o venderam como escravo aos ismaelitas ― mais tarde, o próprio José deixa claro que quem o enviou ao Egito foi Deus, e não a traição de seus irmãos de sangue (Gn 45:5)... Foi necessário José passar pela dura escravidão e pelo humilhante cárcere reservado aos estupradores, acusado de um crime que não cometeu, para que Deus o estabelecesse como governador do Egito. E esta elevação não se deu para satisfazer o sonho do coração de José, e sim para conservar em vida a nação hebreia no período da fome, assim como todas as demais nações que compraram o trigo egípcio. Mais uma vez, os sonhos de deus suplantam os do homem . 

Se dermos uma olhada no Novo Testamento, vemos um homem cego na estrada de Damasco. Este homem, educado nas letras da Torah aos pés de Gamaliel, membro do Sinédrio judeu, era talvez um forte candidato futuro a uma vaga neste importante grupo de anciãos. Jesus Cristo não somente destruiu estes sonhos de Paulo, como também reservou-lhe uma vida de privações, perseguições, espinhos e sofrimentos, que culminou em decapitação por ordem do imperador romano.

Poderíamos citar uma penca de homens citados na Bíblia cujos sonhos foram cancelados pelo próprio Deus: Jonas foi obrigado a fazer o que não queria e sofreu as consequências da obrigação imposta por Deus pelo resto da sua vida (ou o que você acha que aconteceu com a pele do profeta, após três dias em contato com os sucos gástricos do grande peixe?); Jeremias foi proibido de casar, e provavelmente viveu em celibato por toda a sua vida, sem constituir família, sem deixar prole após si (algo humilhante para um judeu); Oséias foi obrigado a se casar com uma prostituta para demonstrar o sentimento divino pelo povo de Israel (você se submeteria a este capricho divino??). 

Todos os sonhos destes homens ― e olha que só citei alguns! ― foram cancelados e anulados, em prol de um sonho muito maior; o sonho de Deus. Não foram inimigos quem cancelaram tais sonhos; foi o Deus destruidor de sonhos!

Por isso, quando eu canto este hino, jamais uso a expressão MEUS SONHOS. Sempre a substituo por TEUS SONHOS, pois compreendo que os sonhos de Deus é que devem se cumprir em mim, e jamais os meus sonhos pessoais e mesquinhos devem ser respeitados por Deus, que se obriga a satisfazê-los no tempo e na intensidade que EU QUERO.

Eu tenho muitos sonhos... Gostaria de ser rico, ter bom carro, boa casa, quem sabe uma casa de praia e uma chácara no campo, dinheiro no bolso e tempo para gastar este dinheiro, viajar, fazer compras no shopping, almoçar e jantar em bons restaurantes... Quem sabe nem precisar trabalhar... Sonhar não custa nada!

Não peco por ter tais sonhos, desejar tais benesses para minha vida pessoal. Mas será que alcançarei todos, quem sabe alguns, ou eles serão anulados por Deus em prol de Seu Reino? Será que tais sonhos, uma vez satisfeitos, não me afastariam de Deus e de Seu Reino? Não sei... Só sei que estes sonhos, cada um deles, todos eles, estão submissos aos sonhos de Deus. Os sonhos dEle, certa e indubitavelmente, são mais altos e mais nobres que os meu. Por isso canto a plenos pulmões: “Remove a minha pedra, me chama pelo nome, muda a minha história, ressuscita os TEUS sonhos...”.

“Bem sei eu que tudo podes, e nenhum dos teus sonhos pode ser frustrado” (Jó 42:2)

Um comentário:

  1. Veja também o exemplo de Calebe. Nunca clamou por ressurreição porque jamais se deixou abater, não experimentando, assim, a “morte espiritual”.
    A fidelidade de Calebe, sua perseverança e seu comprometimento com a vontade de Deus são impressionantes.
    Nasceu escravo no Egito, cresceu sonhando com a liberdade e, ao conquistá-la, lutou com todas as forças. Presenciou os sinais e maravilhas operados por Deus desde o Egito. Recebeu a importante tarefa de espiar a terra e voltou com ânimo redobrado, não se intimidando ante as dificuldades. Por causa dos ingratos, dos desobedientes, dos omissos, dos murmuradores, dos medrosos, dos infiéis, etc, vagou quarenta anos no deserto e guerreou outros cinco, até ver a promessa se cumprir. Não se rebelou contra Deus, não teve sentimento de vingança, não decidiu fundar nova religião, apenas manteve a fé e a obediência.
    Quarenta anos com uma dieta rica em MANÁ: sem refrigerante, sem churrasco, sem rodadas de pizza, sem trufas de chocolate, somente FÉ.
    Quarenta anos sem ternos de alta costura, sem sapatos espalhafatosos, sem abotoaduras folheadas a ouro e nem ao menos uma gravatinha de zíper.
    Nunca pregou em cruzadas milionárias nos resorts cinco estrelas ou em cruzeiros marítimos luxuosos em altas temporadas de verões.
    A viajem à Terra Santa que ajudou a liderar não foi em classe executiva de modernos supersônicos ou em jatos fretados, tampouco em jatinhos adquiridos com dízimos e ofertas ou com venda de indulgências.
    Nunca imprensou Deus na parede exigindo a contrapartida pela extremada fé.
    Aos oitenta anos só tinha um amigo da mesma geração: seu líder Josué. Mesmo havendo uma diferença de vinte anos para mais em relação às demais pessoas, não havia crise de gerações nem ideias ultrapassadas. Um homem idoso com a mesma jovialidade após tanto sofrimento. O mesmo ímpeto para a luta, a ousadia e a garra para conquistar sua herança, e a capacidade de fazer a terra repousar da guerra.


    Valdir Rocha

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