segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

CONSIDERAÇÕES SOBRE A "TEOLOGIA DAS SEMENTES"


De autoria do irmão Valdir Rocha - vasaro@bol.com.br

No próximo "Evento" em que eu participar, talvez passe antes em uma mercearia e leve dali alguns grãos, quem sabe milho ou feijão, talvez um tubérculo, e quando algum propagador da "Teologia das Sementes" começar a apelar para meu emocional, eu as deposite na sacolinha ou no envelope para ver se eles vão aceitá-las ou jogá-las no lixo. Mas já sei que na Lei da Semeadura deles só se aceita dinheiro vivo, cartão de crédito, cheque, carro, moto, jóias, escritura de imóveis e dente de ouro.

Esses homens já não querem mais viajar em ônibus de linha ou em voos comerciais. Querem seus próprios ônibus personalizados, com sua imagem estampada e seu nome em letras garrafais, para serem muito bem conhecidos pelos homens. Querem seu jatinho particular, pois não querem se submeter aos atropelos das perdas de tempo, atrasos e outros entraves dos voos comerciais ― gastamos dinheiro, mas "remimos o tempo"... Querem mansões e carros luxuosos importados, querem hotéis de cinco estrelas, querem ternos de alta costura, querem cruzeiros e viagens para a Terra Santa, querem tardes de autógrafos, sessões de fotos, bajulação, e querem que eu me cale, pois se eu me levantar contra tais coisas estarei tocando no ungido de Deus. São homens de elevada sapiência, Doutores em Divindade, indubitavelmente ungidos por Deus e que, por isso, devem comer o melhor desta terra, mas que tripudiam sobre os "fracos na fé", porque não são obrigados a suportá-los.

Então, quero entender. Para estes doutores, no livro de Malaquias deveria ser rasurada, ou melhor, rasgada a parte em que admoesta os sacerdotes (leia-se ungidos) ao arrependimento e ao bom proceder, ficando somente a parte em que chama a atenção do povão (leia-se não ungidos) a permanecerem fieis nos dízimos e ofertas, ou melhor, nas "sementes". O que passar disso, o que questionar, o que inquirir, o que desconfiar e que for à Bíblia ver se as coisas são mesmo assim, o que publicar qualquer coisa em blogs e sites, seja ANÁTEMA, pois ousou tocar no ungido de Deus.

Se é assim, o profeta Natã deveria ter sido silenciado por falar palavras duras ao "ungido" rei Davi no caso do adultério. O próprio Davi deveria tê-lo silenciado, impondo sua posição de rei e ungido e mandando-o para a mais "acolhedora" masmorra... E quanto a Joabe? Ele praticamente manda o pai "ungido" Davi engolir o choro e tocar a vida pra frente, quando da morte de Absalão. O que dizer dos profetas que tinham a petulância de confrontar reis "ungidos", apontar-lhes os erros e chamá-los ao arrependimento? E o que falar do “sem-ter-onde-cair-morto” João Batista, que combatia asperamente a prática deturpada de alguns "ungidos"?

Deixem-me entender isso melhor. Os primeiros cristãos eram homens de fé porque vendiam propriedades e depositavam suas sementes aos pés dos apóstolos, porém os apóstolos eram "trouxas" porque não as pegavam para seu próprio deleite, bancando uma vida confortável e abastada, mas "repartiam a cada um, conforme a necessidade que cada um tinha". É isso mesmo?

Mas, então, na verdade, os primeiros cristãos também eram “trouxas”, pois semeavam sem colher. Nunca tiveram carro com cabine dupla, motor 4.2, trio elétrico, ar condicionado, GPS, air bag duplo, freio a disco, rodas de liga leve, pneus radiais, DVD player, sensor de estacionamento. Aquelas mulheres nunca fizeram lipoaspirações, nem cirurgias plásticas no nariz, nem covinha no queixo, nem aplicação de botox, nem turbinaram seus seios com silicone. Ah, é verdade... Naquela época não existiam estes "mimos"... Mas porque eles não usufruíam dos "mimos" existentes na época, como riquezas, casas, campos e vida regalada? Porque eram "trouxas", óbvio!

Vai entender o eunuco etíope, mordomo-mor de Candace, superintendente de todos os tesouros da Etiópia, “trouxa” por abraçar uma doutrina de “trouxas”. Quem sabe o carro em que seguia era de placa branca, e estivesse na hora de ele semear uma oferta de qualidade para determinar a bênção do carro próprio. Talvez deveria partir para a iniciativa privada. Quem sabe uma frota de camelos-táxi. Apostaria num resort cinco estrelas no meio do deserto, com cassino, piscinas, centro de convenções e toda a infraestrutura para os apóstolos promoverem seus confortáveis congressos lucrativos e cruzadas milionárias, com espaço para os pregadores... ops, Conferencistas Internacionais top de linha, como Apolo e Barnabé, e para os estandes de venda dos artistas... ops, levitas.

Na Bíblia dos GRANDES da atual dispensação, alguns textos deveriam ser complementados, como o de Deuteronômio 15.11: Pois nunca deixará de haver pobre na terra, “porque sempre haverá os que não semeiam”. Estevão provavelmente semeou grãos de areia, porque colheu pedras. Os Heróis da Fé de Hebreus 11.4-11 deveriam ser chamados "Trouxas sem Fé", pois "morreram na fé, sem terem recebido as promessas" e, resignados, "confessaram que eram estrangeiros e peregrinos na terra".

Falando em trouxas, o que dizer de alguém que anda na contramão desse pensamento dominante? Quem deixa o esplendor de sua glória para nascer como filho de um pai carpinteiro e de uma mãe "do lar" é "trouxa"? E se nascer em "Belém Efrata, pequena entre milhares de Judá", é "trouxa"? E se nascer num curral é "trouxa"? Se, recém-nascido, for posto numa cocheira, é "trouxa"? Se seus pais tiverem que fugir às pressas (coisa de crente fraco) para o Egito (de onde os pais de seus pais já haviam fugido no passado, e Deus havia orientado a não mais voltar para lá) e não para Miami ou Orlando, é "trouxa"? Se exercer a profissão do pai a pontro de ser chamado de "carpinteiro" pelas pessoas de sua cidade, é "trouxa"? Se formar um corpo ministerial com pessoas despreparadas, com a ralé, é "trouxa"? Se não tiver onde reclinar a cabeça, é "trouxa"? Se for um “manteiga derretida”, sempre movido de íntima compaixão pelos doentes-fracos-pobretões, é “trouxa”? Se sua entrada triunfal for montado em um jumentinho sem tração nas quatro patas, é “trouxa”? Se viver cercado do "Zé Povinho", é “trouxa"?

Se for hospedado na casa do chefe dos cobradores de impostos, se andar sobre as águas, se ordenar à tempestade que se acalme, se multiplicar o peixe e o pão, opa, é super como eles. Mas se usar o peixe e o pão multiplicado para alimentar o “Zé Povinho” de graça, sem cobrar nada, é “trouxa" novamente? Se não pedir uma "oferta de fé" é “trouxa"? Se não pedir que invistam em seu ministério sob a alcunha de colaboradores, patrocinadores, Gideões da fé, Neemias reconstrutores, é "trouxa"? Se for preso e açoitado, é “trouxa"? Se for condenado sendo inocente, é "trouxa"? Se for pregado na cruz, é “trouxa"? Pregado entre dois ladrões, é "trouxa"? E se prometer levar um dos ladrões direto para o Paraíso, sem que este ladrão tenha plantado pelo menos uma semente de R$ 911,00 em seu ministério, é "trouxa"? Se morrer jovem sem usufruir do primeiro mandamento com promessa, é "trouxa"? Se for sepultado em túmulo emprestado, é “trouxa"? E se depois de tudo isso ressuscitar e ainda voltar para deixar as últimas instruções, é “trouxa ao quadrado"?

O que estamos vendo é que homens ditos “de Deus" estão promovendo a desinformação. Já não se pede ofertas no mesmo intuito de Paulo e seus companheiros, que pediam para o sustento dos pobres. E a própria palavra "companheiro" deles não provém etimologicamente do latim vulgar companio, que por sua vez vem do latim clássico cum panis (com pão, aquele que conosco divide o pão disponível), porque o pão deles não é repartido, mas conservado em suas próprias despensas, pois, no dizer deles, ao alimentarem os famintos estarão fomentando a indolência. Estão pervertendo o direito das viúvas que são verdadeiramente viúvas, e dos órfãos que são verdadeiramente órfãos.

E o que dizer do direito dos estrangeiros? Estes têm o direito de permanecer calados, se já não foram “deportados" da nação eleita e do sacerdócio real, à revelia, sem o devido processo. A todo momento nos lembram que somos suas ovelhas, e  como ovelhas disciplinadas devemos permanecer resignados, confinados em seu aprisco, mudos, pastando onde não há capim, pois nos amedrontam com fábulas de lobos maus. E nem percebemos que quando tratam nossas feridas o verdadeiro objetivo é não danificar a lã, porque sempre somos tosquiados quando o inverno chega, para que eles, os pastores, possam tecer belos casacos para seu próprio uso..

Que estas coisas não venham a desestimular “os trouxas de plantão", porque já sabemos que estaríamos sujeitos a tudo isto, alertados pelo próprio Senhor Jesus Cristo: “E surgirão muitos falsos profetas e enganarão a muitos. E, por se multiplicar a iniquidade, o amor de muitos esfriará. Mas aquele que perseverar até o fim será salvo" (Mc 24.11-13).

Lembre-se: enquanto Cristo "semeava" na cruz, Ele não contemplava os reinos deste mundo e sua glória, porque almejava uma colheita muito mais preciosa: você e eu. O interessante da Lei da Semeadura e da Colheita é que ela funciona sim, mas sabe qual a melhor semente que você tem? Você mesmo. Então mãos à obra, lavrador!

2 comentários:

  1. Caro irmão,lendo esta publicação percebi que você, me permita essa intimidade, lê a mesma Bíblia que eu tenho lido nestes últimos cincoenta anos.
    Só gostaria de fazer um reparo: o irmão esqueceu-se de mencionar os relógios de ouro que esses sevandijas adoram ostentar, eles devem adotar o lema. Time is money...ou seria, gold?
    Deus te abençoe, venho todos os dias dar uma passadinha neste porto, e me alimentar
    V.D.M.I.Ae.

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    1. Caro Barão, muito obrigado pelo elogio. O texto, como está creditado, não é meu (isto me lembra muito o Maluf...), mas aqui só escrevo ou publico coisas deste quilate! Continuo agarrado à Bíblia. Sou um teimoso, mais um idiota e mais um otário, como são taxados os bereianos pelos atuais e famosos profetas tupiniquins da prosperidade... Permita-me publicar coisas suas também, devidamente creditadas, pois o que vi no Blog do Barão é coisa fina!

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